terça-feira, 26 de novembro de 2013

aparente caos da máquina do cosmos

                   art by colleen cunningham
certo dia, admirei um senhor que se levantava todos os dias de manhã, cedinho, sentava-se na calçada e ficava olhando as pessoas passarem. por que será que aquele senhor escolhia acordar tão cedo para ficar sentado ali sem fazer nada? foi aí que me transportei para sua mente e vi os ônibus que passavam abarrotados de gente, os ciclistas que cortavam os carros (e vice-versa), as pessoas que preferiam se arriscar a caminhar nas ruas do que nas calçadas, os cachorros vira-latas que saiam a procura de comida, as carroças que passavam com seus cavalos trotando. em sua cabeça, todo esse caos fazia sentido. a velocidade da cidade interiorana, que queria se urbanizar, virava sinfonia diante de seus olhos. ali, sozinho, vendo cada pequeno indivíduo seguir com suas vidas, sentia-se completo. não porque vivia à margem da sociedade, mas porque conseguia ver o papel de cada um que passava por ali. os trabalhadores na parada de ônibus, os pais que levavam suas crianças para a escola, as pessoas que iam comprar pão, os estudantes com suas mochilas pesadas nas costas, os pedreiros labutando desde cedo nas esquinas. quem passava por aquele homenzinho, sentado, recebia em troca um olhar sereno e um sorriso reconfortante de quem entendia bem como funcionava a máquina do cosmos.  

domingo, 10 de novembro de 2013

naquele dia a polícia não nos parou



fez de tudo para ele se aproximar, gostava do seu estilo e de suas risadas. estavam dançando. ela queria que ele fosse muçulmano mas nem sabia porquê. um homem-bomba que no final só explodiria a si mesmo por pensar demais. só sabia que seus dentes eram perfeitos e que causava nela uma vontade peculiar de sair por aí cometendo crimes. bonnie estava tão empolgada mas clyde matou-a em troca. a dança interpretativa tinha acabado. y aquel que había muerto no estaba tan muerto así. no final ele se aproximou mas não o suficiente e nessa noite bonnie dormiu sozinha.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

objetos desfocados

                      art by hasmik avetisyan

levante esse corpo pesado do chão que a sua condição não se resolverá sozinha. há tanto a se fazer e ninguém a quem reclamar. enquanto escutava a música alta de seus órgãos fundamentais funcionando, ah então estava bem, saiu caminhando em busca de algo que ainda não sabia o que era. já que não estava morta precisaria provar que estava viva. foi para a cidade. os cabelos muito longos e ondulados, balançavam enquanto caminhava, às vezes incomodando-a. as luzes de um parque de diversões a distraíram de sua infelicidade e resolveu que lá era o seu lugar. o moço que guardava a roda-gigante parecia interessado em suas longas pernas mas tudo o que ela queria era sentir a brisa do vento lá de cima. ignorou-o completamente, tirando o fato de que meio que precisava dele para comprar os ingressos e ter acesso ao brinquedo. mas depois disso ignorou-o completamente. esperou sorridente, na fila. não gostava delas e nem de expectativas mas às vezes esperar era bom, aumentava o valor do prêmio final. sentou-se sozinha em um dos bancos e preparou-se para subir. no início o brinquedo era devagar, mas em sua primeira volta ganhou velocidade e fazia o mundo girar ao seu redor. sentiu-se plena. era assim que ela via a existência, um grande borrão de seres transeuntes e objetos desfocados. por isso, a grande circunferência que girava era o seu brinquedo favorito. dentro dele era o único momento que sabia que todos ali se sentiam como ela, tonta e assustada.